Reflexões sobre a tecnologia

Quarta-feira à noite. Reunião conceitual na escola do filho. Tema: a infância na contemporaneidade. A palestrante, psicóloga, levanta sua bandeira: preserve a natureza da criança. Questões sobre a “adultização” da criança e infantilização do adulto são discutidas por todos.

Pais presentes dispostos a ouvir. Ávidos por aprender a como educar seus filhos num mundo tão competitivo, rápido, mutável, comunicativo, violento, caro. Nenhuma fórmula mágica nesse sentido mas uma certeza: criança tem que ser criança e precisa ser educada como tal. Dizer o não, dar limites, horários, dosar, podar.

Vários pais levantam as mãos e, incentivados talvez pela crítica central em relação à TV, culpam o “excesso de tecnologia” nos dias de hoje ao se referirem não apenas à TV mas a computadores e internet, vídeo games e celulares. Levanto a mão e coloco um questionamento no ar: qual é de fato o maior desafio contemporâneo, o controle à TV, internet, games e dispositivos celulares ou o real entendimento de como lidamos com a tecnologia?

Percebo que as pessoas de modo geral não entendem muito bem o que é tecnologia e isso limita uma percepção muito importante a meu ver: ela veio para acelerar processos e facilitar (?) nossas vidas mas também restringe nossa maneira de enxergar e até experenciar o mundo.

A ubiqüidade da tecnologia é uma realidade. Do elevador ao jato; do respirador a última geração de máquina de radioterapia; do telégrafo ao Twitter; do brim coringa ao novo tecido usado pelos campeões de natação; do Attari ao Wii. Por que não considerar essa evolução tecnológica – rapidíssima diga-se – como a grande mudança do mundo contemporâneo?

Vamos forçar uma barra e simular um mundo sem TV, computador e luz até para limitar a entrada dessa tal tecnologia na cabeça das nossas crianças? Ou vamos compreender melhor suas pontos positivos e negativos e viver em harmonia?

Trabalho com tecnologia desenvolvendo soluções com design e percebo a facilidade das crianças em conviver com artefatos de última geração de um lado (parecem que já nascem sabendo) e de outro a imensa dificuldade de idosos em lidar com os mesmos. Como é frustrante uma análise de usabilidade de um site (qualquer, afirmo!) com pessoas da terceira idade.

De maneira mais ampla, como defendo, é muito difícil para pessoas mais velhas vivenciarem este mundo tão cercado de recursos e funcionalidades que “facilitam” e aceleram nosso dia-a-dia. E essa dificuldade vem, talvez, da rapidez que essas mudanças vieram. Não houve tempo para uma acomodação.

Mas mudar isso é impossível. Forjar uma situação para tentar voltar o tempo não vai resolver nada. Nossos filhos não serão iguais a nós. As próximas gerações não terão as mesmas experiências que nós, mas isso sempre foi assim!

Dosar as coisas é o ponto.

Essa é uma responsabilidade imensa para pais, educadores e também para aqueles que desenvolvem tecnologia seja ela qual for. É muito importante folhear um livro em pesquisa e também buscar na internet. Ver um programa na TV e também ver o sol se pôr. Jogar uma partida de tênis num Wii e também um pique bandeira no parque. Diagnosticar um paciente com última geração de exames mas também com o olho e o toque clínico. Desenvolver um site com ultra modernos recursos de animação e Flash que o tornem mais dinâmicos mas com outros recursos tanto ou mais modernos que o tornem mais simples.

Estimulo meu filho com tecnologia mas também o levo pra passear de bondinho em Santa Teresa. Estimulo meus alunos com computadores e uso de softwares colaborativos, mas também os obrigo a usar lápis e papel em trabalhos de grupo. Estimulo meus funcionários a utilizarem os mais modernos Macs mas também cobro roughs em papel.

Desde sempre, não podem haver rupturas. Devem ser passagens, vivências, experiências. É assim que aprendemos. É assim que crescemos. Essa é minha bandeira ;)

Comentários

Unknown disse…
Oi professora, gostei do texto.Lembrei do Texto do Rubem Alves
"O TELEFONE CELULAR" http://www.ibbetania.com/2009/09/o-telefone-celular/

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